10/02/2008

Desafio do contragrado vital

" - Para que eu deveria deixar tudo que trouxe no carro? Nesta bolsa estão coisas que me protegerão do calor do deserto.
- E você vem para um deserto para não sentir calor, para não se sentir perdido? Para que se importar de sair de casa? Ou larga sua bolsa no carro e vive o que lhe ofereço ou fica no carro esperando as fotos que lhe trarei."



Sobem ao topo do monte Graal
as laicas soberbas virgens
temperadas com a obviedade do suplício
mas estranhamente sorrindo, felizes

Soerguem das plataformas geófagas
as hastes florais, sempre crescentes
verticais sempre e muito,
carentes das flechas de luz solar

Reabrem devagar meus seis karmas
que sempre guerreo intentando fechar
e inundam meus concernes com idéias passadas
com festas há muito terminadas
festas que ainda lembro o que tocava
e repito a dança, na solidez que me confiro
representando o ato sólido do sonho morto
sendo o sonho mais real que existe

Desmudam os monges do voto silencial
e pregam em revolta as tuas repetições
que se expõem muito absurdas
e revoltam as pessoas acordadas

Correm todos, cegos, pela corrida do mundo
e transitam vezes rápidos, vezes devagar
vagam sempre sem rumo, por mais que tentem rumar
se perdem e choram, uns se riem da perdição
e são os que riem que ouço e quero
os que estão e sabem que são perdidos
e não querem se achar, nem nada encontrar
mas vagar cegos, caindo, perdendo,
correndo, sorrindo, de mãos dadas
separando do interno coração o medo,
da razão, que enlouquece a alma, o corpo

Não entendo nem reconheço norte
nas virgens de Graal nem nos monges mudos
não os vejo, não sei quem são
nem as flores que brotam do chão
Mas não entender é o maior truque
que uma mente sã escolhe para si

ou escolhe descobrir respostas e perder:
a sanidade
a sensibilidade
a crença
a inocência
a felicidade
a possibilidade.

Um comentário:

Juliano Lopes disse...

Descubri seu blog por acaso, li apenas este post, mas posso afirmar - uma grande descoberta.

Faz algum tempo que eu não leio algo com tanta intensidade de significado e coesão entre os símbolos e idéias apresentados.

Sem dúvida o poema trata de uma grande viagem em torno do sentido da vida, da verdade final, das respostas para todas as perguntas.

No entanto, percebi um certo determinismo quando expõe que toda essa verdade é, de certa forma, inútil, pois está fora de nosso alcance. Lutar contra essa incapacidade natural seria não apenas perda de tempo, mas uma tolice completa. Como as virgens que impõem o próprio suplício para subir ao monte Graal, que, contudo, representa toda a ausência de finalidade objetiva; a busca por algo que, de fato, não se pode ter.

Em seguida, os monges que rompem o voto de silencio retomam a idéia de uma fuga do mundo, ou talvez da mémória que é submetida a uma verdadeira batalha no parágrafo anterior.

Mas tudo isso é desnecessário, pois como as "hastes florais" que sempre crescem, nas sombras, longe da luz solar, há algo dentro de nós que sempre irá fazer tudo voltar à tona, nos jogar de volta ao mundo, ou à memória, por mais que tentemos evitá-los.

No parágrafo seguinte acredito que há a constatação final da inevitabilidade da natureza humana, dessa cegueira que acompanha os nossos atos. Nesse sentido, é exaltada a percepção de que não devemos andar contra a prórpia natureza, isto é, buscar algum sentido além do que é imediato, mas que devemos apenas rir de nós mesmos, da nossa incapacidade, da falta de entendimento, como única alternativa para viver sem impedimentos.

Na última parte, o poema impõe a distinção entre tudo aquilo que seria o conceito final de uma boa vida, ou felicidade, ou - por que não - sanidade, como exatamente tudo aquilo que teria de ser abandonado se tivéssemos a pretenção de entender ou descobrir aquilo que nos é naturalmente impossível conhecer.


Enfim, não sei se eu entendi a verdadeira intenção que você tinha quando escreveu. Talvez eu tenha sido pretensioso demais ao tentar interpretar o seu poema, mas ele é realmento ótimo, não pude me conter. kkk

De qualquer modo, Parabéns pelo poema e pelo Blog!!